A luta da CNTE e de seus sindicatos filiados em defesa da lei do piso salarial profissional nacional do magistério, expõe heranças patrimonialistas de grande parte da classe política brasileira, e as falhas de um federalismo que precisa, urgentemente, sofrer mudanças para o bem da democracia e de um Estado com garantias de direitos sociais.
Se, por um lado, a “prefeiturização” do ensino ensejou maiores compromissos das municipalidades – que, à época, não se preocuparam com a qualidade da educação, mas tão somente com os cifrões per capitas que as matrículas escolares trariam para os cofres públicos -, por outro, a incapacidade tributária, aliada à frouxidão na fiscalização dos recursos públicos, impede que muitos municípios mantenham um padrão mínimo de qualidade de seus serviços básicos, incluindo a educação.
Fica, então, a pergunta: não seria justo que a Constituição previsse um parâmetro, a exemplo do PIB per capita, para que os entes federados pudessem gozar de plena autonomia administrativa? Essa alternativa, ao contrário da concepção de Estado Único, enseja a responsabilidade da União em tornar eficientes as gestões dos entes que a integram, com vistas a garantir a equidade dos serviços públicos à luz dos fundamentos e objetivos republicanos.
Não se pode esquecer que a formação da maioria dos municípios, no Brasil, seguiu critérios estritamente políticos – da conveniência patrimonialista -, de modo que a medida acima sugerida, de controle da eficiência pública, caracterizaria a efetiva responsabilidade social do Estado brasileiro para com seus cidadãos.
É bem verdade que a estrutura federativa clama por uma reforma tributária capaz, por exemplo, de instituir padrão de qualidade para a educação (preceito constitucional), sobretudo quando se constata que as redes municipais atendem a maioria das matrículas escolares com a menor parcela dos tributos arrecadados. Isso reforça a tese de que arranjos colaborativos, instituídos para amenizar o desmonte do Estado através da reforma neoliberal, são insuficientes para atender às necessidades sociais de educação, saúde e segurança, principalmente.
Contudo, ao invés de os políticos se juntarem em torno da superação dos gargalos tributários, especialmente os que possibilitam a renúncia fiscal eleitoreira e os desvios de verbas, os mesmos preferem apresentar contas amorais para justificar a pretensa incapacidade de honrar o piso salarial de R$ 1.451,00 (anunciado pelo MEC) para o professor da escola pública, que também necessita de tempo para realizar seu trabalho fora da sala de aula – e isso, obviamente, custa dinheiro!
Para a CNTE, a contribuição e a partilha tributárias são dois temas a serem vencidos no debate da distribuição da renda com equidade social, juntamente com a efetiva fiscalização e punição da malversação dos recursos públicos. E as propostas da Confederação, nessas áreas, consistem em: (i) regulamentar o regime de cooperação institucional, através do art. 23 da Constituição; (ii) instituir Lei de Responsabilidade Educacional com o escopo de medir a capacidade contributiva e de induzir o correto investimento das verbas públicas, em cada ente federado, possibilitando, na medida suficiente e eficaz, a solidariedade federativa para o atendimento equitativo dos serviços públicos (além de promover a alavancagem socioeconômica das regiões menos abastadas); e iii) aperfeiçoar o controle social, por meio de gestão democrática das políticas e dos gastos públicos, propiciando auxílio aos órgãos fiscalizadores do Estado.
Valor do piso em 2012
Embora a CNTE reconheça o compromisso e o esforço da presidenta Dilma em manter o preceito da Lei do Piso, no que tange ao critério de reajuste anual – desafiando governadores contrários à valorização real dos vencimentos das carreiras do magistério -, bem como a atitude corajosa da deputada federal Fátima Bezerra (PT-RN), que através de recurso opondo à decisão esdrúxula da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, propiciou a manutenção da atualização real do piso do magistério, é preciso destacar que a fórmula adotada pelo MEC para correção do Piso, à luz do parecer da Advocacia Geral da União, continua contrária à Lei 11.738 e pode ser contestada pelos sindicatos da educação na justiça.
A redação do art. 5º da Lei do Piso não deixa dúvida que o mesmo reajuste aplicado ao Fundo da Educação Básica, de forma prospectiva (para o ano em vigência) deve também incidir na atualização monetária do piso remuneratório do professor. Porém, o critério adotado pelo MEC, para o Piso, considera o crescimento do Fundeb dos dois últimos anos, o que gera uma defasagem anual no valor do reajuste.
Outras duas incoerências sobre o tema referem-se ao ano base de incidência da primeira atualização do piso (a CNTE defende 2009, e o MEC 2010) e aos prejuízos decorrentes da desoneração de impostos, à época da crise mundial de 2009, quando recursos federais repassados a estados e municípios a título de compensação das perdas na arrecadação tributária, inclusive as vinculadas à educação, deixaram de ser destinados aos salários dos educadores.
Neste sentido, para a CNTE, em 2012, o piso nacional, que serve de referência para os vencimentos iniciais das carreiras de magistério de nível médio, equivale a R$ 1.937,26 para jornadas de trabalho de, no máximo, 40 horas semanais, conforme preceitua o § 1º do art. 2º da Lei 11.738. Ademais, a Confederação espera que o Congresso rejeite a proposta de reajuste do piso, puramente pela inflação, como pretendem os governadores, uma vez que a mesma contraria o espírito da valorização do magistério esculpido na Lei do Piso e na meta 17 do projeto de lei do novo Plano Nacional de Educação.