Sindicato dos Servidores do Magistério Municipal de Araucária.

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Fernando Mariano

O Plano Nacional de Educação (PNE) atende determinação do art. 214 da Constituição Federal, que o prevê como instrumento de planejamento e de articulação das ações educacionais das diferentes esferas administrativas, com duração decenal.

O PNE ora em discussão foi concebido para dar sequência ao PNE 2001-2010.

A par disso, esperava-se que vigesse no decênio 2011-2020. Todavia, somente em dezembro de 2010 é que o Poder Executivo o apresentou à Câmara dos Deputados, onde tramitou como Projeto de Lei nº8.035, de 2010. Com isso, sob a ótica formal, o País enfrenta lacuna no planejamento da educação desde o ano de 2011.

Aprovado na Câmara, na forma de substitutivo, após longo processo de instrução que contou, de início, mais de três mil emendas, sendo grande parte delas oriunda da sociedade civil, o projeto chegou ao Senado Federal em setembro do ano passado, sendo aqui processado como Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº103, de 2012.

O substitutivo, que mantém a estrutura do PL 8.035/2010, agregou à proposição 59 novas estratégias às 170 originais, além de ter aprimorado o texto legal e as 20 metas incluídas em seu anexo. Ao cabo, pode-se dizer que, com poucas ressalvas, o texto atual do PNE reflete deliberações primordiais da Conferência Nacional de Educação (CONAE) realizada, no ano de 2010, para nortear a sua elaboração. Em consequência, algumas metas do PL original, como as Metas 2, 4, 6, 11, 12 e 20 foram significativamente reformuladas durante a tramitação na Câmara.

A Meta 2 propunha a universalização do ensino fundamental de nove anos para a população de 6 a 14 anos. Agora, está acrescida da previsão de garantia de que 95% dos alunos terminem a etapa na idade considerada adequada, ou seja, aos 14 anos. É certo que essa qualificação contará com o reforço de metas como as de alfabetização plena das crianças no terceiro ano (Meta 5) e de ampliação da oferta de educação em tempo integral (Meta 6).

A Meta 4 objetivava a universalização do atendimento escolar aos alunos de 4 a 17 anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na rede regular de ensino, além de imprimir organicidade àsestratégias atinentes ao atendimento educacional especializado, que perpassa todas as etapas e modalidades da educação. A modificação empreendida no substitutivo tende a favorecer a oferta da modalidade de educação especial em classes e escolas segregadas, a minar a implantação da perspectiva inclusiva.

A Meta 6, de oferta de educação em tempo integral, entendida como jornada escolar mínima de 7 horas diárias, em 50% das escolas públicas de educação básica, foi reformulada de modo a conjugar o número relativo de escolas com o atendimento de pelo menos 25% do total de alunos da educação básica.

Na prática, a mudança reduziu a margem de manobra no uso do indicador, uma vez que uma única turma em uma escola poderia ser computada para efeito da apuração da meta na redação original. Com efeito, a inovação deu maior legitimidade à meta.

Na Meta 11, a Câmara estabeleceu que a oferta de oportunidades na educação profissional técnica de nível médio deve ser triplicada, em lugar da meta proposta pelo Ministério da Educação (MEC) de duplicar essa oferta. De todo modo, é de se destacar que o próprio Poder Executivo vem trabalhando em algumas frentes para a consecução do intento maior nessa modalidade de ensino. Exemplar a esse respeito é a expansão da rede de Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e a criação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC).

A Meta 12, que previa a elevação das taxas bruta e líquida de matrícula na educação superior para 50% e 33% respectivamente, foi acrescida da previsão de que 40% das novas vagas devem ser providas pelo setor público. A medida repõe a importância do Estado na equalização de oportunidades de acesso à educação superior, sobretudo na interiorização desse nível de ensino, pouco atrativa para o setor privado.

Na Meta 20 do PL, estipulava-se a ampliação progressiva do investimento público em educação, de modo a atingir o patamar mínimo de 7% do produto interno bruto (PIB) até o final do decênio. A Câmara fixou o índice de 7% como meta para o quinto ano de vigência do PNE e estabeleceu, ainda, que o investimento público em educação pública deve chegar a 10% do PIB ao final da vigência do plano.

A meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do PIB encerra conquista recente da sociedade brasileira. Depois da frustração do intento de emplacar meta similar no PNE 2001-2010, quando a fixação em 7% do PIB acabou vetada pelo Presidente da República na Lei nº 10.172, de 2001, a preocupação foi trazida ao ordenamento máximo por meio da Emenda Constitucional nº 59, de 2009.

No art. 214 da Constituição, a fixação do percentual correspondente ficou remetida ao PNE. Desse modo, esse índice deve ser definido à ocasião de cada plano. Certo é que o índice adotado expressará a importância e a prioridade que o País atribui à educação no concerto das políticas públicas, ao indicar uma parte mínima da riqueza nacional a ser empregada em benefício de todos e do futuro. No presente caso, a fixação de 10% do PIB traduz reivindicação da sociedade civil amplamente difundida nos últimos anos, especialmente na Conae 2010.

Para se ter noção da implicação da meta, o PIB do Brasil em 2012 foi de R$ 4,4 trilhões. Assim, 10% desse importa, em números de hoje, R$ 440 bilhões. De acordo com as estimativas disponíveis, que apontam investimento do País em torno de 5% do PIB em educação, precisaríamos, na prática, dobrar esse investimento. Dessa forma, será indispensável o aumento substancial dos recursos aplicados em educação em todas as esferas administrativas, embora se espere que a União avoque a si maior responsabilidade no contexto atual. Além disso, não se pode olvidar de novas fontes de recursos que se somem às atuais.

Conquanto não se tenha diagnóstico preciso, que indique a necessidade de fixação desses 10% do PIB, é certo que as carências do País na área vão desde a universalização do acesso a todos os níveis de ensino, passando pela criação de condições para permanência dos alunos, até a qualificação da oferta em todos os segmentos. Há setores com défice gigantesco, cujo atendimento tem sido sistematicamente postergado. Na educação básica, por exemplo, as metas de cobertura que demandam maior investimento e coordenação de ações, são, a nosso ver, as de educação infantil, tratada na Meta 1, e de educação de jovens e adultos (EJA), que constitui o objeto das Metas 8 e 9.

A criação de vagas em creches, por exemplo, envolve, pelo menos, dois problemas: alta demanda e custo elevado. A oferta de creche em tempo integral, modalidade cuja demanda é acentuadamente maior, é a etapa que requer maior investimento por aluno no conjunto da educação básica. E no PNE em análise há uma focalização de atendimento para as camadas socialmente menos favorecidas.

Na EJA, o atendimento é voltado para a população com mais de 15 anos de idade que conta com menos de oito anos de estudos. Esse contingente é estimado hoje em cerca de 60 milhões de pessoas. A meta implica, pois, a oferta de oportunidade de conclusão da educação básica a pelo menos 30 milhões de brasileiros.

Ainda na educação básica, a Meta 17 do PNE propõe equiparar a renda média dos profissionais do magistério público à renda média de outros trabalhadores com escolaridade equivalente, no sexto ano de vigência do plano. Trata-se de meta desafiadora e de realização dependente de incremento substancial de recursos ao orçamento da educação. Sem um arranjo que garanta a redução da desigualdade entre os entes federados, dificilmente a meta será realizada.

Certamente, o projeto contém metas alentadoras e respostas oportunas para problemas históricos na educação brasileira, de solução reiteradamente adiada. Nada obstante, o sucesso deste plano não pode prescindir da garantia de financiamento. Infelizmente, em que pese o manifesto apoio político à adoção da Meta 20 do PNE, remanescem indefinidas as fontes adicionais e sustentáveis de onde advirão os recursos necessários à consecução dessas metas. Do jeito que se encontra, a Meta 20 deixa a questão em aberto.

Março/2013

Fernando Mariano é Consultor Legislativo do Núcleo Social, Área de Educação.
Boletim Legislativo Nº 12, do Senado Federal

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